A estratégia do Estado contra a gripe suÃna e suas debilidades
05 Jul 2009
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Por: Gilson Dantas
A estratégia adotada pelos governos e pela OMS já foi chamada por um especialista (Mike Davis) de estratégia de contra-insurgência viral. O inimigo exclusivo é o vÃrus, as armas são as vacinas e os antivirais. O mocinho: as grandes corporações farmacêuticas e de biotecnologia. O vilão: um povo indisciplinado que insiste em ficar andando de um lado para o outro e nem máscara quer usar e que ainda protesta contra o governo ao invés de simplesmente obedecer e ter fé na boa-vontade dos especialistas governamentais e dos pecuaristas, esses heróicos empresários “produtivos†que “geram empregos†.
Sem ironia: a estratégia sanitária do Estado tem se resumido a tratar do problema apenas como se fosse uma questão de vÃrus-vacinas e medicamentos e ao mesmo tempo de vigiar as vÃtimas da gripe chegando ao ponto de militarizar seus movimentos, internar à força, proibir reuniões, manifestações e aglomerações públicas com o uso da polÃcia (o caso do México é emblemático a respeito, mas aqui em BrasÃlia foi baixada resolução legal que permite internar à força qualquer um que seja considerado “suspeito†de ter o vÃrus da gripe suÃna).
Não consta nenhuma notÃcia, de nenhuma parte do mundo em que o governo use a força do Estado contra as multinacionais de porcos e aves e seus mega-chiqueiros ou granjas insalubres e imundas. Força policial contra as vÃtimas, paz e amor para os vilões da gripe. Eis um pouco da estratégia das autoridades incluindo as sanitárias. Aproveitando, como parte da polÃtica de “combate†à gripe, para militarizar e jogar a policia contra os movimentos sociais. Ao invés de ser ouvida e integrada à s ações sanitárias como sujeito que é, a classe trabalhadora é combatida como parte dessa estratégia de contra-insurgência viral.
Um setor da esquerda mexicana denunciou a manipulação interessada dessa situação que
“está llevando a que ya se hable menos de todos los fracasos económicos del gobierno mexicano, de la corrupción, de las bancarrotas, del desempleo galopante, del empobrecimiento, las desapariciones, el feminicidio, las vÃctimas civiles de la “gloriosa guerra†contra el narcotráfico†¦ de todas las demandas populares. Y las medidas tomadas por el gobierno mexicano apuntan todas en esa dirección: suspensión de todas las garantÃas de libertades sin que haya resistencia popular a esas medidas. Un ensayo de guerra del miedo. Por si habÃa dudas sale el presidente Calderón diciendo que para combatir la gripe se queden tod@s en casa. Pero el decreto de la SecretarÃa de Salud (Ssa) es mucho más claro: Aislamiento de las personas que “puedan†tener la enfermedad, inspección de transportes, viajeros y equipajes, el ingreso policial a todo tipo de casa o local, evitar congregaciones de personas en cualquier tipo de local o de reunión, regulación del tránsito, control de los servicios telefónicos y de correos, de las transmisiones de radio, televisión y escrita†¦ todo ello sin que sea necesaria una orden judicial. Un verdadero toque de queda y estado de sitio. Y todo ello en un momento social explosivo de luchas populares, busca evitar por el miedo y prohibir por decreto las movilizaciones del dÃa 3 y 4 en solidaridad con Atenco, del 1º de Mayo, huelgas de la minerÃa en Sonora, de enseñanza en Oaxaca†¦ Todos esos tiros y botes de humo para sacar a la gente de las calles, a obligar a las personas a recluirse en sus casas y a perseguir a quien el gobierno decida dentro de sus mismos hogares los han lanzado los medios de comunicación cortando incluso con el espÃritu de la solidaridad prohibiendo el contacto humano, el abrazarse, besarse†¦ La epidemia en México son sus gobernantes, la represión, la pobreza, el desempleo; (MILITARIZACION... , 2009).
Os problemas dessa estratégia de contra-insurgência viral
O primeiro problema dessa estratégia é polÃtico: exclui à s vÃtimas das ações e iniciativas de prevenção e combate à praga, inclusive a suas causas. O segundo problema é técnico, epidemiológico: a gripe se espalha mais rápido do que qualquer tentativa de combate ao foco, de controle dos pacientes de um determinado lugar.
“Talvez não seja surpreendente que o México careça tanto de capacidade quanto de vontade polÃtica para lidar com enfermidades avÃcolas e pecuárias, mas acontece que a situação é só um pouco melhor ao norte da fronteira, onde a vigilância se desfaz em um infeliz mosaico de jurisdições estatais e as grandes empresas pecuárias enfrentam os regulamentos sanitários com o mesmo desprezo com que costumam tratar os trabalhadores e os animais†. Fonte: Jornal Brasil de Fato p. 12, 30 de abril a 6 de maio 2009 =
Outro ponto fraco (e escandaloso): o sistema de monitoramento e alerta contra os focos de doentes pela gripe suÃna simplesmente não funciona.
Não funcionaram na gripe aviária e não funcionaram na grupe suÃna. Os lÃderes comunitários que se mobilizaram contra as Granjas Carroll muito antes das autoridades sanitárias admitirem oficialmente esse surto de gripe estão sendo processados e presos neste momento, como se viu acima. Cientistas que alertaram há muitos anos para o potencial dos chiqueiros serem focos de eclosão de uma praga viral de novo tipo não foram ouvidos pela OMS, por exemplo, muito menos pelo ministério da Saúde mexicano.
O que existe ali é uma enorme e bem paga burocracia sanitária bastante maleável aos interesses das grandes corporações. “A Organização Mundial de Saúde (OMS) conhece bem esse panorama, por isso é uma vergonha que tenha mudado o nome de gripe suÃna (que também assola os humanos) para o neutro “influenza A/H1N1†, para desvincular as empresas de criação industrial de porcos do que realmente são: causadores da epidemia†. Fonte: Jornal Brasil de Fato p. 2, 14 a 20 de maio 2009 .
Um especialista criticou a OMS e os governos dos grandes paÃses em não se preocuparem com os focos da gripe nos paÃses onde a explosão da epidemia é mais provável: estão, acima de tudo, preocupados em se blindar, em organizar suas barreiras sanitárias. E monopolizam os laboratórios e a tecnologia para análise e detecção do vÃrus. PaÃses como o México ’ um dos governos mais vassalos dos Estados Unidos ’ sequer possuem unidades de diagnóstico da gripe suÃna. O imperialismo não transfere tecnologia (a população vem em segundo lugar, o lucro das indústrias genético-farmacêuticas em primeiro). E seu sistema de saúde pública está em decadência além da falta de condições para uma alimentação básica para todos: daà a mortalidade desta praga concentrar-se quase que totalmente, neste momento, no México.
Governos e autoridades sanitárias do capitalismo sabiam e sabem da situação sanitária que deriva da criação de suÃnos, sabem como se incuba e se recombina vÃrus naquelas condições, no entanto não vigiam, não combatem o foco, a causa. Ao mesmo tempo em que criminalizam e discriminam a vÃtima, os trabalhadores.
Um dos principais problemas dessa estratégia, dessa pseudo-medicalização do problema é que esconde um dado elementar e fundamental da ameaça da gripe suÃna.
Tome-se os números atuais (maio), semanas após iniciado o surto: o maior número de pessoas comprovadamente infectadas pelo vÃrus da gripe suÃna encontra-se nos Estados Unidos, mas o maior número de vÃtimas fatais está no México (mais de oitenta mortos no México para em torno de dez nos Estados Unidos). Qual a dúvida sobre qual população está correndo o maior risco diante do mesmo vÃrus? O povo mexicano está em piores condições sanitárias e de privações sociais do que o norte-americano. Só isso já depõe contra qualquer tentativa de medicalizar ou criminalizar o problema.
Só isso já é revelador do papel da classe trabalhadora mexicana como alvo da super-exploração pelo grande capital, processo escancarado pelo Nafta (que submeteu profundamente a economia mexicana ao imperialismo norte-americano) e que acumulou miséria, doença e agora as mortes pela gripe suÃna.
Portanto aquela estratégia onde o vÃrus é tudo e vacina mais antiviral é a salvação, prima por esconder o essencial: a linha de frente epidêmica, a linha de frente das vÃtimas em escala de massa encontra-se naquelas populações de trabalhadores e suas famÃlias que são o foco da exploração e espoliação capitalistas. São comunidades e bairros pobres que têm menor acesso a vegetais frescos (frutas e hortaliças) e a alimentos nutritivos e maior acesso à poluição ambiental, sofrem todo o impacto do estresse urbano e trabalhista (más condições de trabalho e aberta exploração da sua mão de obra), além de carências de todo tipo, não apenas de infra-estrutura sanitária mas também habitacional, em termos de transportes e dos bens e conforto desperdiçados pelas camadas mais ricas que giram em torno da grande burguesia.
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